Marginalização e Higienização Social no Coreto

blog do nelson lisboa
Coreto fechado há mais de 1 ano e meio: necessidade ou higienização social? (foto: internet)

 

Há mais de um ano e meio Salto viu desaparecer um dos principais palcos da periferia de manifestação cultural. O fechamento do Coreto da Praça da Matriz fechou um dos palcos mais importantes da cultura local, seja para os amantes do Hip-Hop e seus elementos e demais manifestações culturais. Sim, há a pandemia e a questão da aglomeração, mas os tapumes no local são simbólicos, concorda?

Trocou-se a administração e o local segue “fechado”.

Veja o texto do Coletivo Pátria Nossah.

 

(POR COLETO FAMÍLIA PÁTRIA NOSSAH)

Os Coretos são encontrados praticamente em todas as cidades brasileiras, são espaços que ocupam praças e que foram criados na Europa a partir do século XIX após a Revolução Francesa, e que surge com o sentimento dos cidadãos locais de compartilhamento do espaço urbano.
Com isso, o coreto acabou cumprindo algumas funções ao longo do tempo, fossem elas recreativas ou até mesmo políticas, como palanque para discursos, atos, manifestações e pronunciamentos.
Contudo, nos dias de hoje os coretos são utilizados principalmente para funções culturais e artísticas, como: danças, apresentações musicais, apresentações teatrais, exposições e saraus.
Um exemplo disso, é que em 2014 o coreto da nossa cidade passou a receber mensalmente o “Sarau Pátria Nossah”, que toda primeira quarta-feira do mês recebia jovens do movimento Hip Hop para declamarem poesia, além de diversos outros eventos culturais realizados por artistas da cidade.
No entanto, ainda na gestão do ex-prefeito Geraldo Garcia, no dia 04 de outubro de 2019 o coreto foi fechado com tapumes; o site da Prefeitura informava que o coreto teria sido fechado para reformulação, com a explicação de que a intenção era torná-lo um novo equipamento cultural e multifuncional.
Porém, o que causou certa estranheza é que dias antes, um vereador da situação e um pároco da igreja Matriz relatavam preocupações com os moradores em situação de rua que ocupavam o espaço a certo tempo.
A medida do fechamento do coreto com tapumes e a dispersão dos moradores em situação de rua – que segundo relatos aconteceu durante a madrugada sob repressão policial, fato que segundo os próprios moradores ocorreram várias vezes, nos remete a pensar numa situação que mais se aproxima de uma política de limpeza social que visa eliminar os elementos “indesejáveis” do local, do que propriamente uma reformulação, ou reforma, como anunciou a prefeitura, pois a realidade que temos, é que a gestão se foi, e não se cumpriu com o prometido.
Mas, vale ressaltar, que o mesmo ex-prefeito, em 30 de novembro de 2017 mandou fechar com paredes os espaços existentes na biblioteca e na concha acústica onde moradores em situação de rua também ocupavam os espaços, todos tiveram que se dispersar, e mais uma vez, sem nenhum diálogo por parte da prefeitura.
Exemplos e ações como essa podemos considerar como políticas higienistas, marginalização e limpeza social executadas por meio de arquiteturas hostis, que sem nenhuma política de inclusão, marginalizam, discriminam e afastam esses moradores dos cartões postais da cidade.
O mesmo ocorreu com a nova gestão do Prefeito Laerte Sonsin Jr. que logo no início da sua gestão, no dia 12 de fevereiro de 2021, a pedido dos taxistas que faziam ponto na rua Henrique Viscardi, mandou retirar os abrigos que ali continham com a alegação de que os moradores em situação de rua que ocupavam o espaço os incomodavam.
Ainda sobre o coreto, no dia 03 de outubro de 2019 o atual vice-prefeito Edemilson Santos, quando ainda vereador, encaminhou um pedido a prefeitura para que fosse implantado o projeto: “Coreto Cultural”, para fomento da cultura e uso do espaço por artistas da cidade; o mesmo ainda comentou sobre o abandono do espaço e sobre a ocupação dos moradores em situação de rua no coreto, e reforçou para que fosse feita a implantação de um albergue na cidade para acolher esses moradores.
Atualmente, o CREAS do Jardim três Marias funciona teoricamente como um CENTRO POP – Centro de Referência especializado Para Pessoas em Situação de Rua, que em tese deve ser um espaço de referência para convívio social e desenvolvimento das relações de solidariedade e diversas outras ações e serviços para essas pessoas, porém, o que se vê no momento, é que, para além de estarem à margem da sociedade, hoje também se encontram às margens do Rio Tietê dormindo em barracas de acampamento, necessitando urgentemente de melhores estruturas, e que a gestão atual não tenha um olhar para essa condição como suficiente para os acolher, que possam estruturar melhor o espaço e transformá-lo realmente num Centro Pop com todas as suas funções, e que dê as devidas condições humanas de uso a quem precisa.
Dessa forma, o que podemos compreender é que o poder público, tanto na gestão passada, como na atual, enfrentam a situação que envolve as pessoas que estão em vulnerabilidade da maneira mais simplista possível, assim como outros representantes de gestões públicas, como o prefeito de Curitiba, Rafael Greca, que apresentou um projeto de lei para multar a quem distribuísse alimentos aos moradores em situação de rua, e o ex-prefeito Bruno Covas que mandou colocar pontas de concreto embaixo de viadutos para que os moradores não dormissem, optam por uma política higienista e não inclusiva; defrontam-se sobre a situação de maneira a esconder o “problema”, como se fossem varrer para debaixo do tapete os problemas sociais enfrentados por essas pessoas diariamente.
É preciso pensar em políticas públicas inclusivas que permitam oferecer dignidade, autoestima, e pensar em meios, projetos e ações que venham possibilitar a construção de uma cidade mais Humana, e não uma cidade que simplesmente ergue muros e coloca tapumes para esconder as vistas indesejáveis de seus cartões postais.
No mais, me remeto neste momento à letra de Rap do grupo Inquérito, que diz:
Vocês descobriram o Brasil, né!?
Conta outra … /
É o país cordial, carnaval, tudo igual /
Preconceito racial, mais profundo que o Pré-Sal /
Tira os pobres do centro, faz um cartão-postal /
É o Governo “trampando”: Photoshop-Social”.

Veja o vídeo da canção do Grupo Inquérito.

Clique aqui e conheça a página do grupo Inqúerito.